Sem romantismos para quarta-feira: no dia quinze de
outubro o Brasil comemora o dia dos professores, e nos dá até um ponto facultativo
de presente. Entretanto, sem romantismos, é preciso dizer, ainda que apontando
um sujeito gramatical genérico: o Brasil
torna cada vez mais difícil comemorar o dia dos professores.
Os motivos são múltiplos e conhecidos. Podemos falar
de salários, condições de trabalho, adoecimento mental e físico e mais uma
miríade de causas. Todas importantes, todas dignas de um debate profundo e
sério. Mas o que destaco é outra coisa.
O professorado trabalha com conhecimento. E o
conhecimento, como a autoajuda já popularizou, não é a mesma coisa que
informação. Então, voltando ao ponto: o professorado trabalha com conhecimento,
que diferente da informação, é constituído por meio da reflexão, do diálogo, da
pesquisa e da comparação. O conhecimento, na lógica capitalista, é a mercadoria
que o professorado tenta vender em sala de aula e falha miseravelmente.
As razões do fracasso são quase sempre atribuídas a
nós, o professorado. E como uma boa dose de autocrítica é sempre bem vinda, em
parte é nossa culpa, mesmo. Mas uma parte ínfima, muito pequena, e em muitos
casos uma culpa que se origina na necessidade de pagar contas cada vez mais
caras e que exigem mil escolas e mil aulas por semana.
A principal razão é outra, mais grave, porque
genérica; mais preocupante, porque nos damos conta e nada parecemos fazer: nós,
como sociedade, estamos cada vez mais refratários ao conhecimento como prática
de informação aliada ao diálogo, à reflexão e à pesquisa. E generalizo mais: me
refiro à humanidade, bem generalizado mesmo. Eu sei, muitos dirão que uma
impressão pessoal não é um argumento válido – e é verdade, digo isso sempre aos
meus alunos. No entanto, como este texto não é uma reação do ENEM nem um artigo
científico, me dou a licença de registrar aquilo que vejo todos os dias, no
cotidiano mais habitual e nas salas de aula: cada vez menos queremos ler,
refletir, produzir.
E se nos tornarmos caçadores de culpa, podemos
pulverizá-la em celulares, redes sociais, na inteligência artificial, na informação
cada vez mais fácil – e por isso mesmo – mais falseada. Estaremos certos se
fizermos isso, mas trago mais um todavia: o problema está em nós mesmos.
No anestesiamento a que nos permitimos por causa de
tudo que foi mencionado, na promoção dessa paralisação e das facilidades
desumanizantes, no cada vez mais comum construir de opiniões abdicando dos
fatos. Nesse sentido, os fatos, o observar e analisar dos fatos, o formular de
abstrações e teorias, passos iniciais e básicos do conhecimento, são cada vez
mais ignorados e delegados a algoritmos.
Sim, há pouco o que comemorar. “E no entanto é preciso
cantar”, disse o Vinicius na Marcha da quarta-feira de cinzas. Esse ano
o dia dos professores é uma quarta, ponto facultativo no meio da semana, uma
quarta de cinzas que se segue ao esgotamento, não à festa.
“Há tão grandes promessas de luz”, diz a mesma
canção. É preciso acreditar nisso. É preciso alegrar a cidade. Conhecimento é
gerado por dor, mas depois traz alegria. Na quarta de cinzas do professorado,
em meio a tantos todavias, penso sempre nos porquês. Os porquês fazem cantar.





